sábado, 31 de agosto de 2013

A ARTE DO DESAPEGO

Em tempos de individualismo exacerbado, o mundo parece mais estreito do que deveria ser. Não há amplitude de sentimentos ou troca real de emoções. É tudo marcado por limites estratégicos. Até aqui você pode ir, depois dali mantenha distância de mim, mesmo que seja o essencial. O estranho é que quanto mais se foge do envolvimento, mais se encosta na possibilidade de apego doentio. 
Uma coisa não muda desde o princípio: as pessoas se apaixonam. Mesmo que digam que, a partir de segunda-feira, iniciarão dieta e nunca mais ficarão com quem não retornar sentimento e dedicação. Como assim? O risco do apaixonar-se é esse mesmo - quebrar a cara sem garantia de reparo. 
Se houvesse um modo de evitar o envolvimento, ninguém arriscaria perder razão e sono por algumas horas de delírio romântico. Muitos fogem até mesmo de uma simples amizade. Porque juntou duas pessoas, duas mentes diferentes, bagunçou tudo. E se eu for mais amiga dele do que ele meu? E se me trair contando aquela história que confidenciei, se zombar de mim, dos meus pontos fracos, da minha ingenuidade? 
Caímos na cilada do medo com tanta facilidade que acabamos não dedicando tempo algum ao que realmente importa: o amor. Que seja ele laço paternal, abraço fraterno, mãos dadas em roda de crianças, colo de mãe,  juras de amantes, promessa de romance, amizade para sempre. De todas as cores, de todas as formas, com todo o peso, o amor de quem quer sentir de verdade. 
Embora seja lindo como poesia, não se pode pertencer ao outro. Não se deve marcar carne ou alma como propriedade. É preciso respeitar quem abriga o amor. Para dele, se fortalecer sem amarras. 
Não é relacionamento aberto, moderno e frio. É só questão de inteligência. Se não tenho posse de quem foi por mim gerado, como terei de alguém que me foi apresentado por acaso pela vida? Posse está fora de questão. Tocar, beijar, abraçar, pegar, tudo bem. Tem sentido e faz maravilhas. Grudou, começou a usar muito os pronomes possessivos, esqueça. Virou doença, passou das margens, transbordou. Alguém vai sofrer. Alguém vai querer fugir, o outro arregaçar mangas e dentes. Não vai prestar. Não vai restar sentimento ou dúvida . Tudo para a lata do esquecimento. 
E quando não dá mais certo? Quando as expectativas se chocam com os nãos do outro, com uma parede sólida de indiferença? Então, é dar meia volta sem muito alarde. Soltar os fios, desfazer os laços com calma de bordadeira. Dessa vez pego, dessa pego, desapego. 

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